sábado, 17 de agosto de 2013

Da incontinência existencial...

Fonte
Eu sou a terra.

E por assim o ser, tomo cuidado com pés desconhecidos. Minha sensibilidade é exacerbada, sofre com pés cegos que não tomam cuidado com o lugar onde pisam. Mas não me importo, pois faço esses mesmos pés fincarem ao chão. Faço com que saibam que não podem levantar voo, que eu sou a realidade e que é aqui, em mim, que devem permanecer.

Eu sou o fogo.

E por assim o ser, aqueço a terra. Esquento o espaço e os corações dos pés desolados. Faço a terra esquecer da realidade que precisa lembrar. Sou eu quem arde no sexo ocasional e também quem faz o amor aflorar na pele de primavera dos apaixonados. Apenas calor, mas também sei doer. Sei queimar. E de todo amor aflorado faço cinzas, queimo cada milímetro de pele pelo caminho. É ódio. Ódio por não ser aquecido por amor semelhante ao meu.

Eu sou a água.

E por assim o ser, apago o fogo. Como uma onda, carrego o ódio e as cinzas, substituindo-os por gelo, calma... Solidão. Escondo os ouvidos feridos por mentiras inconsequentes. Deixo a terra inerte, surda para sons exteriores. Deixo que ela exista para si mesma por alguns segundos. Apago a dor fulminante da primavera que já não existe mais.

Eu sou o ar.

E por assim o ser, movimento a água. Lembro a terra de que o inverno não pode durar para sempre e que às árvores não sobrevivem mais à solidão. Lembro-a também que dar ouvidos a si mesma é importante, porém não dar ouvidos a mais nada é egoísmo. Direciono os pássaros, as abelhas e as borboletas para que elas voltem a tocar as flores e a espalhar pólen por sobre as cinzas escurecidas, preparando a terra para uma nova primavera.

Primavera essa que a terra mal pode esperar para chegar.  

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